MANIFESTO
Em 1999 vendi brilhantemente - modéstia à parte - um cadeirão da Vitra, na esquina da Politécnica com a rua Nova de São Mamede: um lounge dos Eames, com repousa-pés, estrutura lacada a preto e estofo em pele cor de nata: um bombom para a alma. Este facto fez-me entrar no - na altura - novo mundo da imprensa da decoração e do design em Portugal. Vi a ascensão e a queda de publicações que, vistas como menores por quem de mal-direito, foram encerradas: depois de ajudarem à promoção das editoras foram as primeiras guilhotinadas pela queda. E como não posso ficar editorialmente viúvo pela terceira vez e fazer de conta que nada se passa, abri este shoppingvisadron.
Não aceito de braços cruzados que a imprensa nacional do sector fique reduzida a revista e meia mensais, feitas com restos que caem dos pratos das internacionais e com borlas enviadas por gabinetes de arquitectura e interiores. Pelo meu lado, vou aqui tentar informar - sem pretensões de formar, cruz/credo! - o que se faz de novo lá para a casa e do que já se fez e vale a pena revisitar em novo contexto. E opinar, que é coisa mais forte que eu, herdada de minha mãe que não resistia a alfinetar sempre que se justificasse; mais que defeito, melhor que feitio, há no alfinetar uma espécie de motor, seja prosaico, seja, em patamares mais acima, civilizacional, que não é de desprezar.
O bom gosto não acompanha obrigatoriamente a espessura da carteira; pelo que tenho visto, é comummente bem pelo contrário, e não me venham dizer que quem tem dinheiro não tem tempo para compor a sua própria casa e necessita de decorador; para mim e para a minha tribo, o segundo maior prazer da vida é entrar numa casa nova vazia e escaqueirada, de calculadora numa mão, e fita métrica na outra e duas mochilas de ferramentas às costas, agarrar a obra pelos cornos e fazer dela o que eu quero.
A decoração nunca acaba, nunca está pronta; acabar um decor mata-o e resigna-o à triste posição de datado; se você cresce e muda, o seu habitat não lhe pode ficar atrás; mais, se crescer consigo e acompanhar a sua visão da vida, o espaço que o rodeia retribuirá e contribuirá para o avanço de ambos: é a simbiose perfeita.
Não existe boa decoração dress down; pode ser boémia, grunge ou esfarrapada, com paredes corridas a aparite usada antes como taipal de obra, mas se tiver um sentido, contar uma história e espelhar quem a usa - idealmente a mesma pessoa que a faz - só pode correr bem e ser dress up.
Não acredito em académicos da decoração e em verdades incontestáveis: não existem tais coisas como cores que choquem entre si, objectos ridículos ou espaços definitivamente medíocres. Dependendo da história contada, o napperon sobre a televisão com cinescópio agigantado, coroados com galo-de-barcelos-ou-nossa-senhora-de fátima-higrométrica podem ser a cereja no topo de um espaço.
Prometo ser um cão de caça na busca do bom - que não é forçosamente sinónimo de novo - e nesta busca não vou ter em conta baixo preço; ver e gostar não implica comprar; se tem este tipo de problema existem boas instituições onde pode tratar a maleita.
Por fim, eu e este meu espaço temos a agradecer, profundamente, a um grupo iluminado de administradores de grupos de media que decidiram encerrar as publicações onde trabalhei entre 2000 e 2012. Graças a estes imprevistos mecenas sou dono do meu método e da minha edição, sem ter que explicar o que é uma mísula, bater-me pela existência da palavra capitonado, definir especificamente o quero dizer com estilo-miss-havisham ou trabalhar até às 2 da manhã porque aquele azul não é o certo:
- mas qual é? phtalo, prússia, ultramarino?
- não sei, não sei o que isso é, mas sei que não é este... traga-me outros.
Por estas e por outras estive indeciso entre blogar ou escrever uma telenovela sobre a vida numa redacção de literatura mensal levezinha; tenho a certeza de que esta é a melhor escolha, e de qualquer maneira, posso escrever o folhetim ao mesmo tempo.
In 1999 I sold brilliantly - modesty
aside - a Vitra chair, on a shop in Lisbon, where I worked for a while: an
Eames’s lounge with footrest, lacquered black
structure and upholstered in cream coloured leather: a candy for the
soul. This made me get into the - at the time - new world of decoration and
design press, in Portugal. I saw the rise and fall of publications that seen as
minors by a bunch of suits, were closed: after helping the rise, were the first
guillotined by the fall. And since I cannot be editorially widowed for the
third time and pretend that nothing is happening, I started this
shoppingvisadron.
I will not quietly accept that the
national deco press is reduced to one and an half monthly magazines, made
with crumbs that fall from the international dishes and freebies sent by
architects and interior designers. For my part, I will try to tell here -
without pretensions of teaching, God forbids! – what is new for the home and
what has been already done and is worth revisiting in a new context. And prick, that is
stronger than my will and proudly inherited from my mother who could not resist
a snipe whenever justified; rather than a defect, there is on pricking an engine
to civilization, that cant be slighted.
Good taste does not necessarily stands by the fatness of the wallet; by what I've seen, is commonly quite
the contrary, and please don´t tell me that those who have the money do not
have the time to compose their own home and so will need a decorator; for me to
my tribe, the second greatest pleasure in life is entering an ruined empty
house, calculator in one hand, and tape measure in the other, two backpacks
of tools on my back, grab the work by the horns and make from it what I want.
A decor never ends, is never
ready; finishing a decor kills it and resigns it to a dated sad position;
if you grow and change, you cant leave your habitat behind; better, if it grows
with you and full fill your vision of life, your space it will rewards you and will contribute to the advancement of both: it is the perfect symbiosis.
There is never good decoration dressed
down; it may be bohemian, grunge or tattered, with walls covered with stained
reclaimed wood, but if it has a sense (tells a story) and reflect the wearer - ideally the same
person that have done it – it can only be fine and dressed up.
I don’t believe in deco academics
and incontestable truths: there are no such things as colours that clash with
each other, ridiculous objects or definitely mediocre spaces. Depending on the
story, the old fashion lace on television’s top, crowned with the Queen’s
Mother picture can be the space's cherry on top.
I promise you to be an hound in
search of good - which is not necessarily synonymous of new - and in this search
will not take into account low price; to see and to like, does not mean to buy
it: if you have this kind of problem there are very good institutions where you can be
treated.
Lastly, me and this blog of mine, we
want to deeply say thank you to a group of enlightened media groups’ administrators
who have decided to close the publications where I worked between 2000 and 2012.
Thanks to these unforeseen patrons I am the master of my way and editing,
without having to explain what is a corbel, to push the existence for the word capitonado, specifically define what I
mean by miss-Havisham-style or work until 2 AM because that was not the right
blue:
- But what is? phtalo, prussia, overseas?
- I don’t know, I do not know what that is, but I know that it’s not one
of these ... bring me another.
For these and others I've been torn
between blogging or writing a soap opera about working among monthly airy
literature; I am sure that this is the best choice, and anyway, I can write the
series at the same time.